quinta-feira, 1 de maio de 2014

Depoimento de Gildo Soares. Perda auditiva - experiências e conselhos.
Unknownquinta-feira, maio 01, 2014 0 comentários



Posso dizer que minha vida se divide agora em “antes” e “depois” de usar aparelhos auditivos. Durante mais ou menos quinze anos fui adiando minha decisão em procurar os recursos disponíveis para corrigir minha perda auditiva, mas quando eu percebi que minha principal e quase única forma de me comunicar e de ver e sentir o mundo tinham se tornado apenas visuais me decidi e fui a luta. E hoje eu posso dizer com toda segurança: quantos anos de qualidade de vida eu perdi por ter adiado por tanto tempo essa decisão. Digo qualidade de vida com toda ênfase, porque é verdade. Só quem vive uma situação assim sabe, existe um temor constante na gente cada vez que precisamos ouvir alguém, aquele medo cruel, que nos faz sentir incapacitados, de não entender. E não entender bem às vezes pode ser cômico ou até trágico, podem-se fazer tarefas ou dar informações absurdamente erradas pelo simples fato de você achar que ouviu algo e na verdade, raios com a rima, mas era uma coisa bem diferente, e infelizmente só ficamos sabendo depois do ocorrido.

Para quem ouve bem, talvez não se dê conta do quanto é bom poder assistir seu programa favorito de TV, sem usar o Closed Caption, ou nem imagina a gama enorme de sons das coisas simples que nos cercam no dia a dia e que a pessoa com deficiência não ouve. Coisas que parecem insignificantes quando se escuta, como o barulho da chuva, uma chaleira chiando, o som da água escorrendo da torneira, o galo do vizinho cantando na alvorada, sem esquecer-se do mais importante de tudo, a melhoria no relacionamento com as pessoas, desde os familiares aos amigos e colegas de trabalho. E neste item temos que ser, mesmo que nos doa, muito compreensivos com os outros, porque cá entre nós, ficar repetindo tudo duas, três vezes é sem dúvida estressante.

Já vi pessoas alegando medo de preconceito por usarem aparelho auditivo, inclusive eu também tinha certo receio, mas após três meses de uso, tive a felicidade de perceber que o preconceito estava em apenas um lugar: na minha cabeça. E inclusive vou mais alem, pude perceber que certas pessoas dos meus contatos do dia a dia, que apresentavam certa impaciência em ter que repetir seus diálogos, tornaram-se mais compreensivas pelo simples fato de eu estar usando aparelho auditivo.

A adaptação é um pouco difícil, nosso cérebro precisa se habituar a nova maneira de ouvir, para isso são necessários ajustes de volume, de sons graves ou agudos, nos primeiros dias a gente se apavora um pouco, mas vai se habituando. Às vezes acontece de aparecer certa angústia por ouvir e não conseguir entender algum som ou conversa nas imediações, para isto descobri a solução: experimente retirar seus aparelhos e se dará conta de que nem você, nem os outros conseguirão ouvir e entender todos os sons, ninguém é super-herói. E não se preocupe se determinada pessoa você continua não entendendo muito bem o que ela fala, a culpa não é sua e sim dela, que por problemas de uma dicção ruim, os outros que ouvem bem, também tem dificuldade em entendê-la.

E para concluir, um fato interessante que eu descobri: há momentos ou situações no nosso dia a dia em que é melhor a gente não ouvir bem, por exemplo, ruídos do trânsito, de máquinas, gritarias entre outros, então basta você retirar seus aparelhos e a intensidade do som que ouvirá será muito menor, opção que as pessoas sem deficiência não tem.  

Gildo Soares
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Jaqueline Moretto Fonoaudióloga CRFa 7299 RS-Especialista em Audiologia-Doutoranda em Ciencias Biomédicas

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